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Municípios cobram repasses atrasados

Geral

06.07.2012

O decreto de calamidade assinado pela governadora Rosalba Ciarlini não agradou os secretários municipais de saúde do Rio Grande do Norte. Não pelo plano em si, mas por conta das várias declarações de gestores estaduais acerca de uma suposta falta de compromisso por parte dos municípios no que diz respeito a atenção básica. Segundo Solane Costa, presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde, o Governo do Estado também é responsável pelas dificuldades de assistência no interior do RN. Como evidência, Solane cita uma dívida de cerca de R$ 48 milhões do Estado com os municípios.

 

A presidente do Cosems afirma que essa dívida é referente a repasses para a atenção básica, o mesmo setor onde, para os gestores estaduais, está o calcanhar de aquiles dos municípios. Uma portaria do Ministério da Saúde regula uma série de repasses do Estado para as prefeituras, desde 2010. Esse repasse, de acordo com Solane, vem sendo continuamente negligenciado. "São repasses referentes a atenção básica e assistência farmacêutica. O dinheiro precisa chegar a cada trimestre e não vem chegando, então é injusto colocar toda a responsabilidade nos municípios", explica Solane.
 
Por outro lado, o secretário estadual de Saúde, Isaú Gerino, garantiu que a maior parte da dívida cobrada pelo Cosems foi contraída  na gestão passada.  Gerino informou ainda que vai convocar a presidente do Conselho para uma reunião,  o que deve ocorrer na próxima semana. "Quero conversar com ela para justamente saber que dívida é essa e como poderemos resolver o problema. Ainda não pude analisar todas as planilhas, mas sei que a maior parte dessa dívida é da gestão passada", colocou. Por outro lado, Isaú  ressaltou que ainda não teve tempo hábil para analisar todos os débitos existentes na Sesap.
 
Os dados citados por Solane Costa, no entanto, são incompatíveis a justificativa do secretário de Saúde. O Conselho de Secretários afirma que há oito trimestres pendentes, ou seja nos últimos dois anos e meio o Governo do Estado não fez o repasse. Nesse universo, cinco trimestres são referentes aos anos de 2011 e 2012, sendo o restante relativo a três trimestres de 2010. "Não tem como dizer que são dívidas anteriores, de anos anteriores, porque a maioria aconteceu desde 2011", aponta Solane.
 
As "dívidas" do Governo do Estado com os municípios potiguares são divididas entre a assistência farmacêutica básica e a atenção básica, além de um repasse para compra de insulina e outros itens para tratamento de diabetes. Na parte farmacêutica, a falta de repasse atingiu a cifra de cerca de R$ 20 milhões, já a atenção básica teve R$ 25 milhões contingenciados. Por fim, o tratamento de diabetes dos municípios ficou sem R$ 3 milhões. Todos os dados são do Conselho de Secretários de Saúde dos Municípios do RN. "Mais de 70% dos municípios investem mais de 20% do orçamento em saúde. Não podemos ser responsabilizados", disse.
 
A governadora Rosalba Ciarlini voltou ontem, em reunião com prefeitos e secretários de saúde, a ressaltar a importância de investimento em atenção básica. Segundo Rosalba, o Estado recebe recursos somente para urgência e emergência. "É obrigação do Município a assistência básica. Em 2011, foram R$ 278 milhões. Não podemos transformar as unidades de urgência e emergência em ambulatórios", disse. 
 
OAB e Sindicato dos Médicos têm opiniões divergentes 
 
A decisão do Governo estadual em decretar o estado de calamidade e o anunciou de um pacote de ações para a área da Saúde Pública no Rio Grande do Norte, com investimentos previstos de até R$ 32 milhões na compra de equipamentos, remédios e reformas em hospitais, levou entidades civis a se pronunciarem através de notas oficiais a respeito do grau de confiança que nutrem em relação as medidas. O apoio maior veio da Assembleia Legislativa, do Conselho Regional de Enfermagem do RN (COREN/RN), do Conselho Regional de Medicina do RN (CREMERN), Ministério Público do Estado do RN (Promotoria de Saúde), Ordem dos Advogados do Brasil/RN (Comissão de Direito à Saúde) e do Tribunal de Contas do Estado que lançaram nota conjunta.
 
Diz o texto: "O Governo do Rio Grande do Norte editou Estado de Calamidade Pública de forma atrelada a um Plano de Enfrentamento em Urgência e Emergência para fins de reestruturação dos serviços de saúde e garantia de melhorias na qualidade e segurança dos usuários do SUS.As Entidades que ao final assinam, cientes da gravidade da situação da saúde no Estado, apoiam a iniciativa do Governo do RN, ressaltando que esperam poder acompanhar a real efetivação das ações planejadas a serem implementadas com a transparência indispensável ao bom agir administrativo."
 
As medidas anunciadas, no entanto, foram acolhidas com ressalvas pelo Sindicato dos Médicos. Horas antes da decretação do estado de calamidade e do anuncio do pacote de ações e investimentos, o Sinmed havia divulgado a intenção de promover "intervenções éticas" em várias unidades hospitalares da rede pública na Grande Natal, com base em denuncias protocoladas em delegacias de policiais sobre as "péssimas condições de trabalho para as equipes e os riscos de vida para os pacientes".
 
O Sinmed, em nota, também afirma que vai acompanhar a aplicação das medidas emergenciais anunciadas e lembra que "O estado de calamidade é um fato provocado por sucessivos governos, inclusive o atual, que não priorizaram a saúde". São citadas, em seguida, "o sucateamento da máquina pública" como "um roteiro que ao fim apresenta como solução mágica as terceirizações, privatizações e a vilanização da figura dos trabalhadores, mais intensamente a do médico".
 
A entidade ressalva que o estado de calamidade não pode servir para "esfriar"  as investigações sobre a "terceirização do Hospital da Mulher, em Mossoró, nem as sucessivas manifestações de entidades para que o governo assuma a gestão de suas unidades, dispensando a intermediação de terceiros". "Temos a expectativa de que a medida não sirva para aprofundar mais ainda a deterioração do sistema, contestado em todo Brasil, de destruição da rede pública e favorecimento a privatizações", acrescenta o Sinmed.
 
A perspectiva de adoção do controle eletrônico (ponto) para a jornada de trabalho dos médicos – uma das mudanças anunciadas na gestão de pessoal da Sesap –  é repudiada como "manobra para responsabilizar o médico por escalas incompletas", mas assegura que a categoria "não se furtará a colaborar em políticas que fortaleçam o serviço público e o direito constitucional de atendimento a saúde que a população tem, mas não nos comprometeremos com medidas que afrontem a lei, mesmo frente a uma decretação de calamidade, crônica na verdade, cujos poderes e instrumentos sejam  utilizados para políticas destruidoras do próprio sistema que tenta proteger". A nota do Sinmed é assinada pelo médico Geraldo Ferreira Filho, presidente da entidade.
 
Governo pede ajuda a prefeituras da Grande Natal
 
O plano de enfrentamento para os serviços de urgência e emergência no Rio Grande do Norte foi apresentado ontem, pela governadora Rosalba Ciarlini, para  os representantes de quatro municípios da Região Metropolitana de Natal: Parnamirim, Extremoz, Macaíba e São Gonçalo do Amarante. O tom da conversa, além de explicativo, foi de cobrança com relação ao atendimento em assistência básica dos munícipes. O Governo do Estado quer mais empenhos de prefeitos e secretários municipais de saúde para desafogar o atendimento nas unidades de urgência e emergência da capital. 
 
Para o encontro realizado na tarde de ontem, na Governadoria, foram convidados prefeitos e secretários de saúde dos quatro municípios, no entanto, apenas os prefeitos de São Gonçalo do Amarante, Jaime Calado, e de Extremoz, Klauss Rêgo, atenderam o convite da governadora. Os secretários de saúde de Macaíba e Parnamirim também compareceram. De acordo com a governadora, o município de Natal não foi convocado porque haverá um encontro específico com a prefeita Micarla de Sousa. "Não convoquei Natal nesse momento porque haverá uma reunião específica. Além disso, a avó de Micarla faleceu essa semana, então, resolvi esperar para que, no começo da próxima semana, possamos sentar para conversar", explicou.
 
Rosalba Ciarlini explicou que é necessário empenho de todos os gestores municipais para resolver o problema da saúde pública no Estado. A governadora anunciou um repasse de verba para construção de Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) em São Gonçalo do Amarante e Macaíba, bem como complemento para concluir a UPA de Nova Esperança, em Parnamirim. Segundo Jaime Calado, a UPA de São Gonçalo terá custo de R$ 1,8 milhão. "A prefeitura já fez sua parte e doou o terreno para o Estado", colocou. "Vamos dar início à licitação o mais rápido possível", disse Rosalba.
 
Com relação à nova UPA de Parnamirim, o secretário municipal de Saúde, Henrique Eduardo, afirmou que a previsão inicial de abertura era maio passado, porém, a obra ficou parada por falta de repasse de verba. Com a sinalização positiva por parte do Governo do Estado, a estimativa é que a obra seja finaliza até o final deste mês. "A gerência e operacionalização da unidade será de competência do próprio Município", disse. Para equipar o espaço, o secretário afirmou que será necessário uma aporte de R$ 2,5 milhões. 
 
O Estado quer ainda agilizar a reforma no Hospital e Maternidade Café Filho, em Extremoz. Para a construção da unidade, foi feito um convênio com o Governo Federal na ordem de R$ 1,2 milhão. De acordo com o prefeito Klauss Rêgo, o Governo do Estado vai destinar R$ 400 mil para a conclusão da unidade. "Esperamos que até setembro esteja tudo pronto", colocou. Klauus informou ainda que, na última quarta-feira, o Ministério da Saúde havia empenhado R$ 1,23 milhão para compra de equipamentos do hospital. "Quando estiver pronto, a unidade será gerenciada por uma Organização Social", acrescentou.
 
A governadora pediu empenho aos prefeitos com relação ao atendimento de saúde básica. "Teremos reuniões com outros municípios da Região Metropolitana de Natal para ajustar essa rede de atendimento. O pedido é que os municípios que têm gestão plena realmente façam cumprir o que é de dever deles com relação à assistência básica. Os municípios recebem recursos do Governo Federal com esse destino", colocou. Durante a reunião, a governadora anunciou ainda que 25 novos leitos foram abertos no Hospital Ruy Pereira. Além disso, avisou que o Governo Federal havia depositadao R$ 10 milhões para cirurgias eletivas.
 
Rotina é de superlotação e desabastecimento
 
O Plano de Enfrentamento anunciado na última quarta-feira pelo Governo do Estado encontrará um cenário de falta de leitos, superlotação, desabastecimento e falhas no gerenciamento de vagas na rede estadual de saúde. Todos esses problemas não são novos. De tanto ser repetidos em entrevistas de gestores e reportagens na mídia televisiva ou impressa, parecem mais do mesmo. Em se tratando de um problema antigo, crônico, o Governo do Estado viu no atual panorama motivos para decretar calamidade.
 
A notícia foi recebida por profissionais e gestores da saúde de forma esperançosa. A reportagem da TRIBUNA DO NORTE falou com alguns diretores de hospitais estaduais na manhã de ontem. Todos eles consideraram a situação da rede estadual caótica e, de fato, calamitosa. Mas segundo eles isso não é algo recente. "Nos últimos meses tivemos um agravamento dos problemas de desabastecimento, enquanto que a falta de ambiência, de vagas, para os pacientes é algo crônico. Então, a situação é mesmo de calamidade pública. Nós esperamos que, com isso, as coisas melhorem", aponta Carlos Leão, diretor administrativo do Hospital Santa Catarina.
 
A falta de vagas, tanto de leitos gerais quanto de UTIs, e a concentração na capital do Estado, é um dos problemas crônicos e graves da rede, que será  alvo de várias ações no Plano de Enfrentamento. A promessa do Governo é viabilizar 288 leitos em seis meses, além de 59 leitos de terapia intensiva. A medida é necessária, tendo em vista os dados dos principais hospitais do Rio Grande do Norte. No Walfredo Gurgel, maior unidade e termômetro do sistema de saúde do RN, havia 95 pacientes no corredor. A contagem foi feita no fim da manhã de ontem.
 
Das 95 pessoas acomodadas em macas no corredor do Walfredo Gurgel, havia 18 à espera de UTIs e 18 aguardando vagas na área de ortopedia, duas das "feridas" do sistema estadual. O restante era relativo a leitos gerais. Uma das pessoas que esperava era José Hilton Rodrigues, aposentado de 65 anos. Com problemas vasculares, José Hilton aguardava desde ontem numa maca vagas em outro hospital para realizar uma cirurgia na perna esquerda. "O atendimento aqui é bom e ruim. É ruim porque a gente pede umas dez vezes pra alguém olhar o paciente e ninguém vem. E é bom porque os enfermeiros, os médicos, são competentes", informa Severina Nascimento, esposa de José Hilton.
 
Já no Santa Catarina, que também tem problemas com falta de vagas, o que tem preocupado os gestores é o desabastecimento. Desde o ano passado que a falta de insumos e medicamentos nos hospitais estaduais tem causado problemas. "Fizemos uma dispensa de licitação a partir do próprio hospital, porque não tem mais como esperar. Alguns itens chegaram e outros ainda estão faltando", explica Carlos Leão. Entre os itens em falta, estão substâncias usadas em anestesias, medicamentos para tratar gastrite, e problemas cardíacos, entre outros.

Fonte: Tribuna do Norte