3201 5491

FALE COM A GENTE

ÁREA DO COOPERADO

Januário Cicco interdita salas do centro cirúrgico e partos cesáreos estão suspensos

Geral

11.04.2013

A situação da Maternidade Escola Januário Cicco (MEJC) caminha para o caos. Além da superlotação, que já se tornou comum na maternidade que é referência no atendimento de gravidez de alto risco, com cerca de 20 a 30 puérperas diariamente acima da capacidade da unidade, a Maternidade sofre com a falta de leitos de UTI Neonatal. A MEJC dispõe de 20 leitos de UTI Neonatal, mas hoje pela manhã tinham 28 recém-nascidos precisando de cuidados especiais, sendo oito em leitos improvisados.

Diante dessa situação, a direção optou por fechar as duas salas do centro cirúrgico e do Centro de Recuperação de Operadas (CRO) para abrigar esses bebês ‘excedentes’ em leitos de UTI Neonatal improvisado. Com isso, a realização dos partos cesáreos está comprometida na Maternidade, que realiza uma média diária de dez cesarianas. Hoje pela manhã os partos cesáreos não estavam sendo realizados na unidade por falta de local.

Para ter acesso ao Centro Cirúrgico é necessário seguir normas de higienização, com a utilização de uma roupa especial. No entanto, como as salas estão interditadas, a reportagem d’O Jornal de Hoje teve acesso na manhã de hoje as salas que estão funcionando, de forma improvisada, como leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal. Na sala onde funcionava o Centro de Recuperação de Operadas, local com espaço para três leitos destinados para as puérperas que ficam após a cirurgia na estabilização, hoje dá espaço para uma UTI Neonatal com quatro recém-nascidos em situação gravíssima. Na primeira sala do Centro Cirúrgico, que já havia sido interditada desde a semana passada, também está funcionando como uma UTI Neonatal improvisada, com três recém-nascidos.

Na noite desta terça-feira (9), mais um bebê prematuro nasceu precisando de um leito de UTI, e como não havia mais espaço, o jeito foi interditar a segunda sala do centro cirúrgico. Na sala, a mesa de cirurgia está desmontada e o recém-nascido utiliza o respirador que normalmente é utilizado pelas mulheres no pós-parto. A sala, apesar de não ser o recomendado, consegue abrigar apenas mais um bebê, pois só há mais um ponto de oxigênio, condição essencial para instalação de um leito de UTI.


MEJC possui 20 leitos de UTI Neonatal. Com oito bebês ‘excedentes’, 4 estão em centros cirúrgicos e 4 no CRO. Foto: José Aldenir
A diretora médica da Maternidade Escola Januário Cicco (MEJC), Maria da Guia Medeiros, disse que diante da situação realizará uma reunião ainda hoje com a equipe médica para discutir quais providências serão tomadas. No início da manhã de hoje já tinha uma gestante de gravidez de alto risco, funcionária da maternidade, para ser submetida a um parto cesáreo, mas não tinha onde realizá-lo. “Ontem à noite, fizemos cesarianas na sala de cirurgia eletiva. Vamos conversar com a equipe para saber se vamos interditar as cirurgias eletivas a partir de amanhã e transformar o centro cirúrgico ginecológico em centro cirúrgico obstétrico e suspender as cirurgias eletivas. Eu não vejo outra alternativa, dentro do espaço físico que dispomos”, ressaltou. Hoje tinham cinco cirurgias eletivas marcadas.

A diretora conta que na semana passada se reuniu com o secretário estadual de Saúde Pública, Luiz Roberto Fonseca e ficou acertado o compromisso por parte da Sesap de que abriria, ainda esta semana, os seis leitos de UTI Neonatal do Hospital da Polícia, que já estão prontos para funcionar. “Eu não soube oficialmente, mas soube oficiosamente que o secretário transferiu as três pediatras que tinham lá para o Hospital Maria Alice. Então, se o secretário mandou os três pediatras que estavam lá e só precisavam de mais duas ou três para abrir a UTI, ele acabou com as perspectivas de reabrir a UTI. Foi uma perspectiva que surgiu semana passada e frustrou-se, pois entendíamos que os leitos que estão prontos poderiam ser abertos hoje, mas não vai acontecer. Diante da situação que estamos hoje, não vemos uma perspectiva que se resolva hoje, nem amanhã”, desabafou. Para a operacionalização dos leitos da UTI Neonatal é necessário uma equipe de UTI, que a maternidade não dispõe hoje.

Para a diretora Maria da Guia Medeiros, no Rio Grande do Norte não existe rede de assistência materno-infantil. “Muitas cidades do interior mandam para Natal mulheres que têm seus filhos na ambulância. A gestão do Estado é caótica. A gestão do município de Natal em 2012 foi sofrível. Este ano, está tentando melhorar, porém vai demorar muito. Para o SUS somos vaga sempre, pois não podemos negar uma vaga, mesmo que coloque no chão. Como uma equipe pode dar conta de 140 mulheres, e seus recém-nascidos se temos 57 leitos para pós-parto e 15 de alto risco e 13 para cirurgia ginecológica, além de seis leitos de UTI materna e 20 de UTI Neonatal. É só fazer as contas: se temos 90 mulheres internadas, a equipe de atenção é a mesma quando temos 140 mulheres nos corredores”, desabafou a diretora.

Em 2012, a Maternidade Escola Januário Cicco realizou 5.403 partos, sendo 2.340 de pacientes de Natal e 3.063 oriundos do interior do Estado. Da totalidade de partos, 2.556 foram de alto risco, o que corresponde a 47,3% do total. No Centro Obstétrico do Hospital Santa Catarina, foram realizados em 2012, 4.664 partos, sendo 1.878 de Natal e 2.786 do interior. A estatística de partos de alto risco é ainda mais baixa, ficando em 43,67%, ou 2.037 partos de alto risco durante o ano.

Obstetras protestam contra falta de condições de assistência ao parto

Os profissionais da Maternidade Januário Cicco e do centro obstétrico do Hospital Santa Catarina participaram na tarde desta terça-feira (9) de uma audiência pública na Assembleia Legilastiva para discutir a saúde pública e os direitos humanos. A diretora Maria da Guia de Medeiros conta que quando recebeu o convite visualizou que era o momento de quem está sofrendo mais, os profissionais que trabalham na MEJC e no Hospital Santa Catarina, participassem de forma ativa da audiência. Cerca de 20 médicos obstetras participaram da audiência.

“Foi quando surgiu a ideia de fazer a camisa com a frase ‘Não ao parto no chão’, que é um protesto contra a falta de condições de assistência ao parto. A audiência foi interessante, pois entendemos ontem que no Rio Grande do Norte não existe direitos humanos, pois o Estado está infringindo todos os parágrafos do que diz os direitos humanos em relação à saúde pública. Mostramos na audiência a situação de abandono que estamos vivendo. De prefeituras que mandam as mulheres em ambulâncias para terem os bebês em Natal, de um centro cirúrgico que está interditado e está sendo transformado em UTI Neonatal sem a mínima condição, sem a mínima estrutura. Pedimos socorro, pois a responsabilidade é do Estado que precisa organizar a rede e o município de Natal que precisa colocar para funcionar na plenitude as três maternidades”, destacou.

Ela disse que ainda não é uma campanha, mas um protesto e que os profissionais que trabalham no Hospital Santa Catarina abraçaram a causa e vão trabalhar no plantão vestidos com a camisa. “Estamos num momento muito difícil, sem desistir, mas de muito cansaço, pois a voz não chega a nenhum lugar e se ela chega à pessoa não escuta. Ela pode até chegar ao ouvido de alguém, mas ainda não tem repercutido absolutamente nada”, desabafou.

 

Servidora da MEJC e Santa Catarina relata condições de trabalho

A obstetra Quitéria Meirelles trabalha no centro obstétrico do Hospital Santa Catarina e também na Maternidade Escola Januário Cicco (MEJC). Ela é taxativa ao falar das condições de trabalho nas duas unidades. “É angustiante. Tentamos dar uma assistência de qualidade, tanto para a mãe, quanto para o bebê, mas pelos inúmeros motivos que vêm se agravando, pela incidência muito grande que temos tido nos últimos dias de partos prematuros, hoje vivemos uma situação atípica, de chegar para o plantão com a sala do centro cirúrgico obstruída com bebês prematuros. A noite de ontem, chegou ao ponto de que precisamos utilizar a sala do centro cirúrgico ginecológico para realizar os partos cesáreos. Hoje eu tinha uma cesariana para ser feita, que graças a Deus não é uma urgência, e estamos tentando encontrar um local para realizar o parto, mas se chegar uma urgência não temos onde operar, apesar de ter equipe”, desabafou.

Quitéria Meirelles considera que hoje a situação da Maternidade Januário Cicco é pior do que a do Hospital Santa Catarina. “Hoje eu não tenho onde operar, mas no Hospital Santa Catarina apesar da superlotação, tem onde se fazer cesárea. Mandamos duas pacientes para o Santa Catarina, sendo referência de lá, com gravidez gemelares, e já tem quatro cesáreas na fila esperando para serem feitas. Isso é muito angustiante”, destacou.

A médica disse que é necessário que seja feita uma campanha, tal como a camisa feita para a audiência pública, a fim de somar forças para resolver os problemas. “Essa frase ‘Não ao parto no chão’ é um protesto silencioso, contra as míseras condições de trabalho. Hoje soube que estão tentando melhorar as condições de temperatura do Hospital Santa Catarina, pois a situação estava insustentável. Eu e muitos médicos que trabalham lá, já andamos com um ventilador no carro. A população está sentindo na pele esse destrato e a equipe está lá sob as mesmas condições. Não é só a parturiente que está tendo que sentar no chão, o plantonista também. A nossa condição não é muito diferente. É uma calamidade escondida. Estamos para trabalhar, mas não temos condições”, desabafa Quitéria Meirelles.

Fonte: O Jornal de Hoje