Manicômio muda de perfil
Geral
24.01.2014
HOSPITAL JOÃO MACHADO INAUGURA ALA DE ATENDIMENTO EM CLÍNICA GERAL, ENQUANTO PRONTO-SOCORRO PSIQUIÁTRICO ESTÁ SUPERLOTADO; MEDIDA VAI GERAR MAIOR APORTE FINANCEIRO DO GOVERNO FEDERAL
O Hospital João Machado, referência em psiquiatria no Rio Grande do Norte, inaugurou esta semana uma ala de atendimento em clínica geral. Os 33 novos leitos, cujo investimento foi de R$ 967 mil, só devem receber pacientes em março, aliviando a demanda do Hospital Walfredo Gurgel. Enquanto isso, 27 pacientes estavam internados em colchões pelos corredores da enfermaria da unidade psiquiátrica, localizada no bairro Tirol.
O pronto-socorro do Hospital João Machado tem 35 leitos disponíveis, mas chega a receber até 70 pessoas por dia. “Precisamos aumentar a estrutura de atendimento psicossocial. No meu último plantão (17 de janeiro), eu atendi 62 pessoas. A falta de leitos é um problema enorme. São frequentes os casos de violência”, afirma o médico Jair Farias, ressaltando que a superlotação gera constantes brigas entre os internos.
O psiquiatra detalha que a característica dos atendimentos está sendo modificada ao longo dos anos. As psicopatias estão dando lugar aos pacientes vítimas do abuso do álcool e das drogas, principalmente o crack. “O Hospital João Machado recebe os usuários de drogas de todo o Estado”, afirma o médico.
De acordo com a direção do hospital, mais de 40% dos atendimentos são destinados aos dependentes químicos. Na enfermaria do pronto-socorro, durante a visita da reportagem, alguns pacientes arrumavam pertences pessoais, enquanto outros se esparramavam em colchões pelos corredores.
Segundo o secretário estadual de Saúde, Roberto Leite Fonseca, a partir de março o hospital também vai receber um novo diretor técnico. Será o pontapé inicial para a mudança no funcionamento da unidade hospitalar. O nosocômio vai passar a fazer parte da rede clínica geral do estado.
A medida tem uma razão financeira. O Ministério da Saúde reduziu os aportes financeiros destinados ao setor psiquiátrico. A abertura para o setor de clínica médica vai resultar num recebimento de R$ 270 mil ao mês. É que o valor da Autorização para Internação Hospitalar (AIH) – o custo do leito definido pelo Ministério da Saúde – para um paciente psiquiátrico é de R$ 49, enquanto que na clínica geral o valor é de R$ 400.
Segundo o diretor administrativo do João Machado, Edenílson Miguel Pereira, os 33 novos leitos só vão receber os primeiros pacientes a partir de março. A estimativa inicial era para outubro do ano passado, quando as vagas foram abertas numa antiga enfermaria desativada. As salas estão prontas, mas não recebeu os equipamentos e o corpo de profissionais ainda não foi contratado pela Secretaria Estadual de Saúde.
Hoje, a unidade hospitalar conta com 151 leitos e uma equipe de 15 médicos e 400 funcionários atuando nas enfermarias masculina e feminina, enfermaria para tratamento de pacientes dependentes de álcool e outras drogas, além do pronto socorro.
O diretor afirma que a mudança no funcionamento do hospital é um mal necessário. Em pouco tempo, os distúrbios psíquicos vão dar lugar aos casos de ortopedia, cardiologia e demais especialidades médicas. “A estrutura de hospital exclusivo para doenças psicossociais está caindo em desuso em todo o Brasil. A lei da reforma psiquiátrica (lei federal 10.216/2001) preconiza a abertura de leitos psiquiátricos em todas unidades hospitalares de clínica geral. A norma também aponta para a obrigação dos municípios a criarem estruturas de atendimento psiquiátrico ambulatorial”, detalha.
Ele discorre sobre a drástica mudança no sistema público de atendimento à saúde mental. As antigas unidades de internação, os famosos manicômios que mais pareciam prisões, estão ganhando uma nova aparência. O João Machado é uma prova desta mudança. “Há 30 anos eram 300 leitos, hoje é a metade. Os pacientes não ficam largados no hospital. O tratamento é voltado para humanização e ressocialização de quem é atendido”, explica Pereira.
Fonte: Novo Jornal