Natal realiza Marcha pela Humanização do Parto
Geral
19.10.2013
Mulheres, familiares, ativistas e profissionais de saúde foram às ruas na manhã deste sábado (19), em caminhada contra os altos índices de parto cesáreo no Brasil e em defesa do parto humanizado. A ação faz parte da Marcha pela Humanização do Parto, a favor da humanização da assistência ao parto e nascimento do Brasil. Os militantes saíram da Praça Pedro Velho, conhecida como Praça Cívica, em direção a Maternidade Escola Januário Cicco (MEJC), quando realizaram um ato silencioso. O protesto dá continuidade a uma série de atividades que vem ocorrendo desde o ano passado, quando realizados os primeiros protestos, com participação de 32 cidades.
A iniciativa da Marcha pela Humanização do Parto partiu da revolta de mulheres na rede social Facebook depois que uma obstetra de São Paulo, Andrea Campos, foi descredenciada da maternidade São Luiz, na capital paulista. A profissional é conhecida e bastante requisitada por trabalhar alinhada com as evidências científicas e recomendações do Ministério da Saúde e Organização Mundial de Saúde, no que diz respeito à assistência humanizada (que leva em consideração o respeito ao protagonismo da mulher e uma experiência respeitosa de nascimento, contra a realização de procedimentos invasivos sem indicação clínica). Esse fato evidenciou outros casos que têm ocorrido em todo o Brasil, sobretudo, na rede privada.
A Marcha tem o objetivo de reivindicar que as mulheres em trabalho de parto não sofram violência obstétrica e tenham o direito de andarem, se alimentarem, beberem água e ter seu acompanhante e sua doula durante todo trabalho de pré-parto, parto e pós-parto; serem atendidas pelo profissional de sua livre escolha, incluindo obstetras, parteiras, obstetrizes, enfermeiras obstetras e doulas; terem seus planos de parto respeitados e serem informadas de todo procedimento ao qual serão submetidas.
Além disso, as ativistas reivindicam que o bebê que nasce bem vá direto ao colo da sua mãe; não seja separado da mãe para intervenções não recomendadas pela OMS e pelo Ministério da Saúde, tenha direito a amamentação desde os primeiros minutos de vida e que o bebê fique em alojamento com sua mãe para que o vínculo mãe-bebê seja estabelecido.
Em Natal, maternidades públicas desrespeitam a Lei do Acompanhante (11.108) e hospitais privados proíbem e ameaçam as profissionais contratadas para acompanhar o trabalho de pré-parto, parto e pós-parto, conhecida como Doulas. No Brasil, uma em cada quatro mulheres relata ter sofrido algum tipo de violência do parto, como maus tratos, procedimentos desnecessários, privações, assédio moral, entre outros. Tentando escapar deste tipo de atendimento, as mulheres têm cada vez mais optado por cesárea. O Brasil é hoje um dos campeões em número de cesárea. A frequência dessas cirurgias aumentou de 37,8% para 52,3% de todos os partos realizados entre 2000 e 2010. Esse número chega a mais de 90% em alguns hospitais particulares e a quase 50% na rede pública, enquanto que a indicação da Organização Mundial de Saúde (OMS) é de que haja no máximo 15% de cesáreas, índice este alcançado em países como Holanda e Alemanha onde a cirurgia é indicada em casos de necessidade, como qualquer procedimento cirúrgico.
Gabriella Vinhas, uma das organizadoras da Marcha, conta que ano passado foi realizada uma Marcha Pelo Parto em Casa, com foco no direito de escolha do local de parir. Este ano, a Marcha acontece depois de alguns episódios de perseguição aos profissionais da humanização. “O parto humanizado utiliza pouco material e faz poucas intervenções, que é o que o Ministério da Saúde e a Organização Mundial da Saúde recomendam como o melhor para a gestante. A cesárea é uma cirurgia legal quando ela salva vidas, quando ela é bem indicada”, explicou. Gabriella conta que em Natal, em alguns hospitais particulares, há a proibição de doulas que não estão dentro do perfil estabelecido pela unidade hospitalar. Com o programa Rede Cegonha, do Governo Federal, as doulas voluntárias, poderão atuar na rede pública de saúde. Hoje, isso ainda não acontece.
“Além da falta de estrutura, já que as maternidades privadas não dispõem de uma sala de parto humanizada, com os equipamentos necessários para que a mulher possa escolher a posição para ter o filho. Pode ser de cócoras, por exemplo, pois a OMS recomenda que as posições verticais são as melhores. A posição deitada é confortável apenas para o médico, mas para a mulher e o bebê não, pois diminui a oxigenação, o períneo não relaxa naquela posição e favorece a Episiotomia. O modelo que temos de assistência ao parto no Brasil já caiu há muito tempo. Um modelo centrado na figura do médico e hospitalocêntrico”, afirmou Gabriella Vinhas.
A jornalista Silvia Ribeiro Dantas é mãe de dos filhos. As duas gestações foram de parto normal, mesmo após as 42 semanas. Ela conta que quando engravidou pela primeira vez, aos 21 anos, estava cercada de profissionais médicos (a mãe, o ex-marido e a própria ginecologista, que era amiga da família), o que lhe deu maior segurança. Quando completou 42 semanas e cinco dias, a médica optou por marcar a cirurgia. A cesárea estava marcada para às 14h, mas o bebê nasceu às 14h10, de parto normal, pois o trabalho de parto começou às 6h. “Foi um parto semi-humanizado, pois não teve anestesia. A única intervenção que eu tive, que depois soube que não era necessária, foi a Episiotomia”, afirmou.
Na segunda gravidez, quatro anos depois, a obstetra quis logo marcar a cesárea, em função de um problema na coluna de Silvia. No entanto, mais uma vez a jornalista questionou a necessidade e optou pelo parto normal. “Se eu já tinha tido um filho tão rápido, tão bem, porque eu ia querer ter um segundo de parto cesáreo. Se eu vou sentir dor é por um problema fisiológico, não preciso abrir a barriga. Mesmo sem ter consciência, ainda precisei ser muito combativa para ter os dois filhos de parto normal”, afirmou. Ela conta que sempre conversa com os filhos, um rapaz de 13 anos, e uma menina de nove, sobre a importância de parto humanizado. “Não quero que a minha filha chegue na médica, e no primeiro dia, a médica queira marcar uma cesárea”, disse a jornalista.
A tradutora Karima Bezerra realizou o parto, de forma humanizada, na sala da residência, no mês de abril, auxiliado pela médica obstetra e uma doula. O parto foi realizado em uma piscina específica para essa finalidade. Ela conta que a contração começou por volta da meia-noite. As contrações se desenvolveram até às 9h, quando ela entrou na piscina, para fazer os movimentos para aliviar as dores. “Estava psicologicamente preparada, pois fiz isso durante toda a minha gravidez. Em momento algum pensei em ir ao hospital. Sempre quis ter meu bebê num local que eu me sentisse tranquila, com pessoas que eu conhecia e a minha casa era o lugar que me deixava mais calma e tranquila”, afirmou.
Por volta das 10h, Karima deu início ao trabalho de parto e às 10h33 a pequena Marina nasceu. “Meu parto foi sensacional, lindo. Foi muito emocionante e tudo tranquilo”, destacou. Ela disse que optou pelo parto natural, pois sempre teve aversão à cesárea. “Não queria ter nenhuma intervenção médica. Estudei muito e acho que o conhecimento foi o que me levou a saber que eu poderia ter o meu bebê da maneira mais natural possível. Optei pelo parto humanizado de forma responsável, pois sabia que não colocaria em risco nem minha vida nem a do meu bebê”, afirmou Karima Bezerra.
Fonte: Jornal de Hoje